5.6.07

Zbigniew Herbert

VOZ INTERIOR


A minha voz interior
nunca me dá conselhos
nem faz advertências

não diz que sim
nem que não

mal consigo ouvir
o que mal pronuncia

e mesmo se me inclino para ela
apenas ouço sílabas
despidas de sentido

presto-lhe toda a atenção
trato-a com a maior deferência

finjo considerá-la meu semelhante
e que é de grande importância o que tem para me dizer

às vezes chego mesmo
a tentar manter com ela uma conversa
- sabes ontem recusei
nunca tinha feito semelhante
e também não seria agora

- glu - glu

- achas então
que fiz bem

- ga - go - gu
- ainda bem que concordas

- ma - a

- descansa agora um pouco
amanhã voltamos a falar

não me serve para nada
podia esquecer-me que existe

não tenho esperança
apenas remorsos
quando a vejo ali deitada
cheia de compaixão
respira com dificuldade
abre a boca
e tenta erguer um pouco
a sua inerte cabeça

Versão de José Miguel Silva
(a partir da tradução inglesa de C. Milosz e Peter D. Scott)

Sem comentários: