11.6.07

Richard Rorty (4/10/1931 - 8/6/07)

"Na minha utopia, a solidariedade humana seria vista não como um facto que haveria apenas que reconhecer uma vez removidos os "preconceitos" ou alcançadas profundezas até então ocultas, mas sim como um objectivo a atingir. Um objectivo a atingir não pela investigação, mas sim pela imaginação, pela capacidade imaginativa de ver em pessoas estranhas companheiros de sofrimento. A solidariedade não é descoberta pela reflexão, mas sim criada. É criada com o aumento da nossa sensibilidade aos pormenores específicos da dor e da humilhação de outros tipos, não familiares, de pessoas. Uma sensibilidade assim aumentada torna mais difícil marginalizar pessoas diferentes de nós por se pensar que “eles não sentem da mesma maneira que nós sentimos” ou que “terá sempre de haver sofrimento e, assim sendo, porque não havemos de os deixar a eles sofrer?”
Este processo de se chegar a conseguir ver outros seres humanos como sendo “um de nós” e não como “eles” é um a questão de descrever pormenorizadamente como são as pessoas que não nos são familiares e de nos redescrevermos a nós próprios. Trata-se de uma missão não da teoria, mas sim de géneros tais como a etnografia, o texto jornalístico, a banda desenhada, o docudrama e, especialmente, o romance. Obras de ficção como as de Dickens, de Olive Schreiner ou de Richrad Wright oferecem-nos pormenores sobre tipos de sofrimento suportados por pessoas em que anteriormente não tínhamos reparado. Obras de ficção como as de Choderlos de Laclos, de Henry James ou de Nabokov oferecem-nos pormenores sobre os tipos de crueldade de que nós próprios somos capazes e, desse modo, fazem-nos redescrever-nos a nós próprios."

In Contingência, Ironia e Solidariedade, Tradução de Nuno Ferreira da Fonseca

1 comentário:

Rui disse...

Fixe, J.M. Parece que também era um grande professor, muito dedicado aos alunos.